Um livro é uma semente. E a semente por si só não se transformará em algo maior do que uma semente, mas tem muito potencial. Para vingar, ela requer água, atenção, terra, proteção, sol…
O livro por si só também não cria uma floresta de novas possíbilidades em nós. Não nos dá a casa decorada e pronta a habitar.
Precisamos de ter disponibilidade para receber essa informação, e essa será a nossa terra que recebe essa semente. Vai ser necessário ir para além da leitura, dar claridade à nossa temperança, regar os nossos sentimentos, pensamentos e ações, e por vezes cortar alguns ramos mais afoitos. Este tratamento especial que cada um dará a si próprio será único e é por isso que uma semente igual poderá crescer de forma diferente, consoante o ambiente onde se encontra.
Será sempre necessário estar atento, consciente e ativo neste caminho que é a vida. É necessário proteger a nossa sementeira, o pequeno rebento que vai brotando até à grande e sábia árvore, pois por vezes é preciso muito pouco para deitar um gigante ao chão. Será fundamental dar calor à nossa semente, mas não nos podemos esquecer de que também existem tempestades e que nem sempre tudo desagua num belo jardim de flores. Às vezes, acordamos num descampado e isso também pode ser normal ou ajudar a potenciar o nascimento de novos rebentos. Será que aguentaríamos a felicidade todos os dias? Como estar na vida com tudo aquilo que ela contém, de bom e de mau? É um desafio! E se, de facto, não conseguimos controlar ou mudar fatores externos, podemos mudar a forma como lidamos com o que acontece, e isto é um grande poder. Mas com um grande poder vem também uma enorme responsabilidade.
Esta é de facto uma das minhas maiores aprendizagens. Aquilo que já passou e que me trouxe sofrimento não pode ser mudado. A minha história, a tua história, é o que é, não pode ser mudada.
No entanto, apercebermo-nos de que temos o poder de olhar de outra forma para a nossa história é um enorme volte-face. É aqui que podemos chegar à possibilidade de agradecer tudo o que nos aconteceu, pois permitiu-nos chegar até aqui. Se não tivesse tido as experiências que tive, algumas tão dolorosas, certamente que hoje não estaria a escrever este livro e não seria psicoterapeuta.
Claro que deixo esta nota de rodapé: isto não valida o que de errado foi feito contigo e não desculpa quem te fez sofrer. Aquilo que faz é devolver-te o teu poder para que, ao invés de ficares preso e arredado a essa má experiência ou a uma pessoa que te fez mal, te possas libertar e recuperar o controlo sobre essa situação, internamente.
Através desta leitura, o meu objetivo é partilhar formas de simplificar gestos do dia a dia, potencializando-os e transformando-os em atos conscientes e passíveis de incutir a nossa própria mudança e evolução pessoal. Quando estamos nesse caminho, às vezes já nos doem os pés, sabemos que a meta está longe e que existem alguns dias em que a tempestade entra na estufa onde guardamos as sementes e as plantinhas. Será muitas vezes assim: construir, reconstruir e resistir aquando de um passo atrás. A evolução pessoal é cansativa, e creio que todos o podemos reconhecer nos nossos próprios processos. Muitas vezes pensamos que estamos sempre a revisitar os mesmos temas ou que nunca mais resolvemos determinada situação. Quantas vezes ouvi pessoas a defender que a ignorância é uma bênção e que os dias precedentes a este abrir de olhos para o mundo interno eram paradisíacos.
Mas como poderia ser melhor viver no total desconhecimento daquilo que nós somos? Sem saber para onde ir, sem ter um caminho para seguir? Sem saber sequer aonde queremos chegar?
A ignorância ou inconsciência sobre nós próprios faz perpetuar estados de infelicidade, insatisfação ou sentimentos de vazio e de falta de propósito.
Este livro pretende ser esse extra, essa ferramenta que, apoiada por muitas outras, pode ser um mapa que ajude no caminho.
É esse o conceito: vamos construir um mapa, navegando pelas ruas, edifícios, jardins, iluminação! Mas este será um mapa muito especial, pois será construído pelo leitor, com base na sua experiência e com as suas ferramentas. Muitas vezes encontramos becos sem saída porque usámos o mapa errado e aquilo que pensávamos que era intuição foi afinal uma decisão com base no medo ou impulso. Noutras situações, damos por nós a usar o mapa de outra pessoa: “se resultou para ela!”. Não quer dizer que resulte para ti… Aqui começa uma nova jornada, esse é o desafio que eu tenho para ti. Deitamos fora os croquis dos outros e construímos o nosso caminho. E no fim, apesar de lermos o mesmo livro, o mapa vai ser diferente para cada um, pois partimos da visão e experiência de cada um para o desenhar.
Ao longo dos vários temas, e antes mesmo de apresentar este projeto que vamos pôr em marcha, é necessária uma condição de base: consciência. A consciência tem vários significados, seja do ponto de vista neurológico ou moral. Neste caso, ou seja, num processo de desenvolvimento pessoal, estar consciente é conseguir estar a par de muita coisa: da nossa história e experiências (passado), daquilo que está a acontecer agora (presente), e das perspetivas saudáveis e realistas que temos para o futuro. Acresce a tudo isto ter a consciência daquilo que queremos trabalhar, isto é, tornar conscientes as nossas dificuldades, desafios, e gerar insights ou pontes sobre possíveis origens ou explicações.
Este processo é complexo e funciona a diferentes níveis. Podemos estar conscientes de algo que nos tocou, como por exemplo alguém que nos magoou, e tentamos perceber o porquê dessa mágoa e que impacto tem na nossa história. Ou pode acontecer o contrário, quando o mesmo evento se repete, mas com um familiar próximo, e o movimento é apenas o de ficarmos inundados pela emoção negativa. O importante é manter uma mente curiosa, que questiona e que quer saber mais.
Seja como for e simplificando: se queres trabalhar alguma coisa na tua vida, é preciso primeiro ter consciência de que existe algo para trabalhar! E por vezes a tomada de consciência não é imediata e existem também diferença que nos distinguem. Alguns de nós podemos nem estar cientes desta necessidade de consciência. Nestes casos, é quase como que uma inconsciência inconsciente. Não estamos, na realidade, conscientes do nosso processo, de onde nos situamos ou para onde queremos ir, em termos de evolução pessoal. Há uma completa desresponsabilização, ou seja, assumimos que nada é da nossa responsabilidade e não nos sentimos culpados por nada (falaremos sobre a desresponsabilização mais à frente). Estamos numa constante busca no exterior da responsabilidade por tudo o que ocorre na nossa vida. É como ter uma consciência contraída, onde aguardamos que alguém surja na nossa vida com uma varinha mágica que faça desaparecer os nossos problemas, ou seja, achamos que não somos donos e muito menos responsáveis pelo nosso futuro, assim como nos consideramos incapazes de mudar alguma coisa. Viver no aqui e agora parece impossível e permanecemos presos nos traumas do passado e nas expetativas sobre o futuro.
Num estádio intermédio, onde é possível contactar com uma maior perceção sobre nós próprios, acresce uma maior responsabilização sobre a nossa vida. Estamos numa consciência mais expandida. Ficamos gratos com o que nos acontece de bom e surpreendidos com as sincronias. Sentimo-nos mais atentos ao que se passa à nossa volta, estar no aqui e agora não é difícil e é cada vez mais um ponto assente, mas permanece a viagem temporal na nossa mente.
Com a maior capacidade de estarmos conscientes e com um maior autoconhecimento, aumenta o contacto direto com a essência: esta seria a consciência mais evoluída. Somos agradecidos por tudo o que nos acontece, seja bom ou mau, prevalecendo sempre um sorriso. Vivemos no aqui e no agora sem qualquer dificuldade.
O passado ficou para trás, resolvido e vivido, e o futuro não é uma preocupação. Vive‑se sem medos e com uma serenidade ativa.