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“Nunca conheci ninguém realizado com relações insatisfeitas” conversa com Rossana Appolloni

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Estivemos à conversa com a Rossana Appolloni, nossa autora e com quem temos vindo a realizar um conjunto de workshops focados na relação que temos connosco e na relação que temos com os outros.

Rossana, nos últimos meses realizaste uma série de workshops na Self, focados na nossa relação connosco e na nossa relação com os outros. Qual a relevância dessas temáticas nos dias de hoje? Que balanço fazes desta experiência?

Tudo começa aí, na nossa relação connosco e, consequentemente, mas também, originariamente, com os outros. É um ciclo constante. É na relação com os outros que crescemos, é através da relação que formamos a nossa identidade, é na relação que se formam as nossas feridas emocionais, mas também é na relação que existe a possibilidade de transformação e ‘cura’. Em crianças dependemos dos nossos cuidadores, em adultos já somos – ou deveríamos ser –nós os cuidadores de nós próprios.

No entanto, por falta de conhecimento e de maturidade, emocionalmente falando ficámos presos na nossa criança ferida que ainda grita por atenção, carinho, aceitação, proteção, reconhecimento, e por aí fora… E temos legitimidade a isso tudo, desde que não seja como cobrança, exigência, chantagem, birra… ou seja, se ainda nos comportamos como crianças, o que vamos encontrar no palco da vida é um parque infantil onde todos andam às turras para ver quem ganha. Mas quem ganha o quê?! Afinal todos queremos apenas estar bem e ter relações que nos nutram e não que sejam campos de batalha.

Muita gente vem ter comigo e procura a minha ajuda na sequência de muita insatisfação e frustração na área dos relacionamentos, sobretudo amoroso. E verifico que sem relações que sejam fonte de bem-estar, dificilmente estamos bem. Nunca conheci ninguém realizado com relações insatisfeitas. Viver isolado no cimo de uma montanha também não é solução! Ganhar consciência do próprio processo de crescimento emocional é fundamental, pois é fácil olhar para os outros quando se olha pouco para si próprio. E a mudança está em nós. Mas isto assusta muita gente.

As pessoas resistem muito à mudança, pois não sabem o que vão encontrar. O desconhecido assusta demasiado. Mas eu não desisto! (risos) E vou estimular as pessoas até me fazer sentido para que se explorem e se descubram, pois é um percurso delicioso!!! Somos a pessoa mais importante da nossa vida e temos tanto medo da relação connosco. Que paradoxo! Somos a pessoa mais importante e queremos ter relações felizes quando nos recusamos a conhecer-nos e a termos uma relação connosco. Não pode ser! (risos)

Penso ter respondido à relevância da temática. Quanto ao balanço, é extraordinário! Muita gente nova, diferente, interessada neste processo de autodescoberta, pessoas participativas e curiosas, desde os 16 ao 70! Algumas pessoas vêm sozinhas, outras trazem amigos ou família; umas têm participado em todos e tornaram-se presentes fieis, outros aparecem de vez em quando. Tem havido de tudo, o que é muito enriquecedor do ponto de vista humano!

Nos próximos dias 14/03, 5/05 e 2/6, vamos ter encontros de aprofundamento, daquilo que foi abordado nos workshops anteriores. Porquê esta necessidade de ir um pouco mais além?

A necessidade veio da partilha de algumas pessoas ao mostrarem dificuldade em pôr em prática no quotidiano o que vão aprendendo nos encontros. Já perceber certas questões não é fácil, torná-las padrão no dia-a-dia nem se fala! Desde a compreensão cognitiva ao comportamento temos uma caminhada por vezes longa e difícil que nem todos se predispõem a fazer. Encontros deste tipo, psicoterapia, e/ou outras atividades terapêuticas que estimulem o nosso sentir é fundamental para continuarmos a crescer. Isto é um pouco como aprender exercícios no ginásio e depois ficar a olhar.

É preciso praticar, de preferência com amor e carinho apesar do desconforto, e a existência de um grupo é um terreno poderosíssimo. Nestes próximos encontros a ideia é estarmos abertos ao que as pessoas colocam como dúvida, dificuldade, ou simplesmente dar feedback através da sua partilha pessoal e trabalharmos a partir daí.

Questão: O que podemos esperar destes encontros?

aprofundamentoOlha, eu também não sei! (risos) Vamos ver o que acontece… Para mim é sempre com enorme gratidão que acompanho a generosidade das pessoas em se partilharem e a coragem que têm em o fazer. Coragem no sentido etimológico da palavra: agir com o coração. Precisamos disso, de pessoas que falem mais a partir do coração, com toda a sua vulnerabilidade e beleza, e menos a partir de uma cabeça que julga, que interpreta, que adivinha, que fantasia, que tem a mania que sabe tudo. Sabemos ainda tão pouco… mas o que vamos conseguido saber sobre nós é um passo importantíssimo.

Como diz um ditado chinês: ‘não tenhas medo de dar um passo, mas sim de ficar parado’; ou outro que gosto muito também que diz algo do tipo ‘qualquer conquista começa com um primeiro passo’. Não sei o que vai acontecer, mas conto com um ambiente de boa disposição e de seriedade, pois são elementos que prezo muito no meu trabalho, reflexo do que sinto ser a vida: leve e profunda.

Mais informações sobre os encontros de aprofundamento: aqui

 

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Lado a lado. Ou frente a frente.

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As relações que vivemos ao longo da vida vão marcando e moldando a nossa visão do mundo, vão alterando o nosso modo de pensar e de sentir. Não paramos de sofrer transformações, nada em nós é imutável. Resta saber se a mudança que advém de relações vividas vai no sentido de murcharmos cada vez mais ou, pelo contrário, florescermos e sentirmos que somos cada vez mais felizes, apesar da dor sentida no passado. Dor e prazer, tristeza e alegria, medo e entusiasmo… são tudo elementos presentes numa relação amorosa. Rejeitar o que nos fez sofrer é abdicar do que nos enriqueceu e fez de nós o que somos hoje.

Quando se tem uma desilusão amorosa há uma tristeza que transparece no olhar de quem acreditou e, mais uma vez, sente ter falhado. Acreditámos, entregámo-nos, lutámos, insistimos até perdermos as forças e admitirmos que toda a energia investida não passou de uma ilusão. E com a desilusão vem a tristeza, vem o vazio, vem o sofrimento de mais uma morte. Já nada será igual. A nossa planta murchou. Não morreu, mas deixou de viver. Sobrevive no meio do caos da vida. Sobrevive até encontrar outro alguém que vê a nossa beleza – ainda que murcha – alguém que nos dá água e alimento e nos faz acreditar que temos forças para florescer de novo. Até voltarmos a perder esse nutrimento e murcharmos mais uma vez.

O ciclo repete-se. Num determinado ponto deste percurso repetitivo, passamos a desacreditar que é possível outra coisa além de sobreviver apenas. Com o passar dos anos, quando alguém nos volta a ver, a coragem para nos entregarmos é diminuta. Agarramo-nos à crença de que a única forma de proteger e salvaguardar o que ainda resta de nós é assumir que o único lugar seguro é a solidão e o vazio. Aí já ninguém nos magoa, estamos a sós connosco próprios. Não vivemos a entusiasmante surpresa da vida que nos faz voar e tocar nas estrelas, mas também não vivemos a angustiante imprevisibilidade que nos faz precipitar a pique. Mas será que uma relação amorosa é esperar que alguém nos salve, nos nutra, cuide de nós, nos leve às estrelas e nos largue bem lá em cima?

Dar sentido a cada experiência vivida, aprender com cada momento de leveza e de tensão, aceder às dificuldades que existem no nosso interior para cuidarmos delas, potenciar as nossas forças e voar cada vez mais alto em liberdade, lado a lado com alguém, ou frente a frente, não será isso muito mais nutridor? As relações fazem parte das aventuras da existência para nos conhecermos, para contactarmos as nossas feridas que gritam por atenção, para percebermos quais são os nossos medos e tratarmos deles. Enquanto não o fizermos, iremos depositar no outro o poder de fazer isso por nós. E quando depositamos no outro essa responsabilidade, ficamos à mercê do seu ritmo e da sua dedicação.

Quando finalmente percebemos esse nosso mecanismo de esperar do outro uma tarefa que nos cabe a nós fazer, então convencemo-nos de que a vida não é voar e cair continuamente. Não pode ser. Mas cuidar de nós é extremamente difícil, não aprendemos a fazê-lo. Então, uma primeira reação será encolhermo-nos ainda mais e, sem darmos por isso, lá estamos nós outra vez a renunciar à vida. Murchamos por ter e perder, murchamos por não ter. Que paradoxo! Qual a lógica disto tudo?

Quando ganhamos a coragem de olhar para nós próprios, ouvindo os nossos medos e necessidades, dando-lhes o devido valor e aceitar que fazem parte de nós e que são indispensáveis ao nosso percurso de desenvolvimento, então ganhamos também a capacidade de os mostrar, não para que o outro cuide deles, mas para que o outro os veja e valide a sua vontade de estar connosco na mesma, de fazer parte da nossa vida. Lado a lado, ou frente a frente.

O amor incondicional é amar sem condições, sem exigências, sem pedidos. É ter a capacidade de olhar e de ver o outro, de se mostrar, de caminhar juntos no que a vida tem de complexo e de simples. Passamos a ser companheiros de viagem, durante a qual assistimos orgulhosamente ao florescimento do outro. Mas para isso temos de sentir que aprendemos com as experiências passadas. Aprender implica alargar a consciência, reconhecer que o que vivemos foi fundamental para o nosso presente e sentir gratidão por essa vivência. Aprendemos o suficiente para chegarmos onde estamos hoje. Precisávamos desse suficiente para chegarmos onde estamos hoje.

Com esta certeza, olhamos para trás e sentimos que tudo valeu a pena e que agora estamos mais preparados do que nunca para voar até às estrelas com alguém a nosso lado. Ou frente a frente.
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Narcisismo: Nem tudo é sobre nós

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Narcisismo: Nem tudo é sobre nós

O narcisismo é apresentado como o mal do nosso século, mas este traço presente na nossa personalidade nem sempre é nocivo. Existe um narcisismo saudável que se reflete num Self seguro de si próprio, estruturado, que reconhece o próprio valor, sabe o que quer, sabe como proteger-se e cuidar de si e identifica os recursos internos disponíveis para alcançar os seus objetivos. O narcisismo passa a ser nocivo, ou até mesmo patológico, quando entramos numa fantasia de superioridade, de sermos especiais e melhores do que os outros, o que nos dá uma certa sensação de legitimidade para fazermos o que quisermos, usando os outros a nosso favor, sem medir as consequências.

Todos nós temos uma certa dose de narcisismo, e ainda bem! Caso contrário não nos sentiríamos capazes de nada. O narcisismo surge na idade infantil aquando da estruturação do ego e nessa fase a criança acredita que o mundo gira à volta dela. Frequentemente se diz, por isso mesmo, que as crianças são egocêntricas. Quando elas querem um gelado querem-no aqui e agora e não empatizam minimamente com os impedimentos que os pais possam apresentar; uma criança, quando, por exemplo, vê o seu desejo de uns ténis de marca a ser recusado, começa a alimentar um ódio para com os pais, identificando-os como pessoas más. Não interessa se não têm possibilidades financeiras ou se os seus valores assim o ditam; o que interessa é que a criança associa a vontade negada a uma rejeição emocional enquanto ser.

Uma criança apenas vê o mundo a partir das suas lentes sem conseguir incluir as dos outros; quer tudo à sua maneira, de preferência rápido, e se os outros não correspondem são vistos como inimigos. Daí os pais, muitas vezes, acabarem por ceder às suas exigências e por condicionarem a vida em função dos filhos, passando estes a acreditar que são mesmo especiais, detentores de um poder capaz de mudar o mundo e os outros. Este estádio é normal e, em geral, ultrapassado. Porém, quando ficamos presos nele, significa que estagnámos no nosso processo de crescimento emocional e nos mantivemos num narcisismo que de saudável passa a tóxico.

Quantos de nós não parámos lá? Quantos de nós não ficámos presos numa visão rígida, achando que a sua perspetiva é a mais acertada? Quantos de nós não nos irritamos quando somos contrariados, quando as coisas não correm como queríamos, quando não alcançamos as nossas metas, quando o outro não responde do modo esperado? Muitos. Cognitivamente crescemos imenso, mas emocionalmente ainda somos bastante crianças.

Vamos então olhar para a nossa criança interior, aquela parte de nós que está cansada de se desiludir, de ver as suas necessidades não acudidas, de esperar que o outro nos veja e nos acarinhe, tal como queríamos que tivesse acontecido (ou acontecia) quando éramos crianças. Vamos olhar para a criança que ainda existe dentro de nós e que nos faz entrar numa tristeza profunda, ou numa zanga, quando o outro não corresponde ao que pedimos. Entramos em dor não só pela frustração de não termos o que queríamos, mas também pela crença que o outro não nos dá porque está contra nós, ou porque não gosta de nós o suficiente. Esta é a associação que uma criança faz.

O olhar do adulto consegue ver o outro e sentir e/ou compreender a sua dor. Se o outro está a ter um comportamento antipático não é para nos atingir, para nos magoar, para nos fazer mal – isso não faz sentido absolutamente nenhum em relações onde as pessoas se gostam –, mas deve-se sobretudo às suas dinâmicas internas que, por algum motivo, estão estagnadas num sofrimento que o leva a não agir de acordo com as nossas expectativas. Acreditar que o outro fez algo apenas para nos ferir é considerar que somos o centro da sua atenção, o que, na maioria dos casos, não se verifica. Cada um tem as suas batalhas internas, pelo que só uma visão narcisista tóxica acredita que o que o outro faz tem a ver connosco.

Claro que todos nos afetamos uns aos outros. Todo o nosso comportamento toca com maior ou menor intensidade consoante o tipo de relação e o tipo de feridas emocionais que cada um tem. De igual modo, o comportamento do outro também nos afeta consoante a nossa história. No entanto, não existe uma relação direta entre o que emissor faz e o que o recetor pensa e sente, pois depende das experiências dos envolvidos. Já me aconteceu vivenciar um atraso como um alívio, ou como um drama.
Somos todos diferentes, cada pessoa é um mundo e fixarmo-nos em interpretações únicas é contraproducente, pois alimentam uma fantasia pessoal que nos distancia da realidade e que poderá ser cor-de-rosa ou negra. Emocionalmente falando, a criança vive na fantasia, o adulto vive na realidade.

Nas discussões que vamos tendo pela vida, nos desentendimentos, nos desafios relacionais, é importante conseguirmos sair da nossa criança que amua ou entra nos seus dramas egocêntricos para conseguirmos olhar para a situação a partir de um lugar de adulto que vê a própria dificuldade e a do outro. Estamos em relação para nos ajudarmos a crescer, não para guerrear com vista a uma vitória. Não é suposto as relações serem batalhas, mas sim fonte de serenidade. Mas para isso temos de contactar com as nossas necessidades de adulto e ver a realidade por aquilo que ela é.

Temos de estar dispostos a abandonar o mundo perfeito que construímos na nossa imaginação. Ter essa disponibilidade é um passo para irmos largando um narcisismo infantil que não contempla os outros, para um narcisismo saudável que nos dá a autoestima e a autoconfiança para seguirmos o nosso caminho, onde incluímos os outros como nossos companheiros, não como inimigos.
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Conheço-me através de ti

Um dos maiores desafios nas relações é aceitar o outro tal como ele é. Aceitar não no sentido de nos sujeitarmos aos seus comportamentos, mas sim de olhar para ele e vê-lo por aquilo que ele realmente é, sem ilusões nem idealizações, e respeitar as suas escolhas, sem a insistência que alterem. Muitas são as vezes em que ficamos incomodados quando não vê as situações como nós, quando não pensa como nós, quando não sente o mesmo do que nós e quando não age como nós agiríamos na mesma situação. Queremos as pessoas à nossa imagem e semelhança e enquanto não tivermos consciência disso, as relações são uma luta para que os outros sejam mais como nós em vez de serem uma oportunidade de crescimento através das diferenças. Uma relação saudável não se baseia na tentativa de mudar o outro (sabemos que é invasor quando tentam fazê-lo connosco), mas sim de aprender a lidar com as diferenças e de crescer através delas.

Ouve-se dizer que o que nos incomoda dos outros corresponde a partes de nós: o chamado efeito espelho. «Mas incomoda-me porque sou assim?». Efetivamente, não faz muito sentido. Quando se diz que o outro é o nosso espelho significa que é através do impacto que o seu comportamento tem sobre nós que conseguimos aceder a partes nossas. Como quando nos olhamos ao espelho: é-nos enviado um estímulo (reflexo do nosso rosto) que tem um determinado efeito em nós próprios. Os estados de paixão também refletem o efeito espelho: não nos apaixonamos pela pessoa, mas pelo que ela nos faz sentir.

Independentemente do estímulo, ou seja, neste caso do outro, o que importa é o impacto que este tem sobre nós, pois o mesmo estímulo pode provocar sensações completamente diferentes em pessoas diferentes. Uma minha cliente contou-me a reação que os dois irmãos tiveram quando ela lhes disse que eram os homens mais importantes da sua vida: um deles ficou muito comovido e sensibilizado e o outro acusou-a de ser manipuladora e de fazer chantagem emocional. A reação de cada um diz muito sobre a história individual.

Assim, para prosperarmos nas relações e, percebermos o que se passa connosco e o que podemos e queremos melhorar, temos de nos questionar: o que estou a sentir neste momento? Que partes de mim é que estão a ser ativadas através da interação com esta pessoa? Que tipo de pensamentos me vêm à cabeça quando penso nela? Quando conseguimos desviar o foco do outro para nós próprios abrimo-nos a possibilidade de crescimento e mudança. Mantermos a atenção nas atitudes do outro é, pelo contrário, uma forma muito eficaz de fugirmos de nós.

O psicólogo Guy Winch tem uma TED Talk na qual explica que não conseguimos tratar das nossas feridas emocionais se nem sequer soubermos que elas existem! E a possibilidade de sabermos que elas existem é quando alguém toca nelas. É como ter uma ferida e não a ver , mas quando alguém nos abraça, a sua intenção estará longe de ser a de nos magoar, mas através do seu gesto somos tocados e isso magoa-nos. Porém, a ferida é nossa! A forma como nós pensamos e sentimos é exclusivamente nossa, não é do outro. Mas é o outro que nos ativa a forma de pensar e sentir, pelo que só através do outro temos esta fantástica oportunidade de entrar em contacto com as nossas dificuldades, bem como com todo o nosso potencial.

Quando encontramos alguém que nos irrita, fazer o exercício de se perguntar qual é a parte de nós que está a ser tocada não é nada fácil. Estamos tão habituados a olhar para fora, a depositar a atenção no outro – criticando, interpretando, julgando e culpando – que a nossa visão fica completamente turva e destorce o verdadeiro cerne da questão. Já Jung dizia que quem olha para fora idealiza e ilude-se; quem olha para dentro desperta. E é através desse despertar que temos a possibilidade de viver as relações de forma nutridora. Ter a humildade de nos pormos em causa e a coragem de enfrentar as nossas dificuldades leva-nos a crescer e a desenvolver todo o nosso potencial. Afinal, é para isso que aqui estamos: dar o melhor de nós próprios para nos sentirmos bem e sermos felizes. A relação é fundamental para isso, pois sozinhos não vamos longe. A relação dá-nos a possibilidade de conhecermos a nossa engrenagem: o que funciona menos bem e precisa de afinação e o que funciona melhor e apenas precisa de manutenção.

Através das dificuldades que sentimos na relação temos a oportunidade de sentir e perceber quais as dinâmicas internas que nos impedem de avançar para uma vida mais autêntica e feliz. Perante uma dificuldade temos duas opções: virar as costas e afastarmo-nos, ou olhar de frente e lidar com ela. A primeira leva-nos para outra relação onde nos havemos de deparar exatamente com a mesma dificuldade, o que significa que estamos a repetir um velho padrão. A segunda, talvez mais difícil e aparentemente mais dolorosa, leva-nos a entrar no jogo da vida para aprender e passar para outro nível de desafio. Crescer pode ser doloroso e leva tempo, mas qual a alternativa?

As dificuldades que sentimos vêm ativar as nossas necessidades. Uma alimenta a outra. Por exemplo, a dificuldade em sentir-se livre ou autêntico numa relação advém da necessidade de se sentir livre ou autêntico e não conseguir; sentir que o outro não nos dá afeto ou atenção está diretamente relacionado com a necessidade de ter afeto ou atenção e não estar a receber o suficiente. Portanto, as dificuldades que sentimos numa relação remetem para as nossas necessidades. Mas as necessidades são nossas e têm a ver com a nossa história de vida, não com o outro. O outro pode estar a fazer o melhor que consegue e, ainda assim, sentimos não ser na dose certa. Ora, uma relação saudável e nutridora é muito mais do que tentar colmatar as exigências um do outro.

Nas relações tóxicas de dependência, o outro existe para satisfazer as nossas carências e quando tal não acontece sentimos frustração, tristeza, rejeição, humilhação, abandono e traição; nas relações nutridoras conseguimos ir mais além e sentimos que a existência do outro nos ajuda a contactar com as nossas fragilidades, que devem ser vistas e cuidadas, bem como com as nossas potencialidade, que merecem ser reconhecidas e valorizadas. E isso só é possível quando olhamos para o outro como uma oportunidade de nos conhecermos a nós próprios e o escolhemos não como salvador, mas como companhia na viagem da vida.

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A minha presença no teu tempo

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À beira da morte ninguém quer morrer. Mesmo quem sofre e não encontra sentido à vida, perante uma situação de possível morte o seu instinto de sobrevivência surge com toda a garra. Mas a vida dói. Custa. Ouvi uma entrevista onde se dizia que todos choramos, mas uns choram sozinhos e outros em companhia. Veio-me à memória uma pessoa que, em terapia comigo, de lágrimas no rosto, disse: ‘só consigo chorar aqui, contigo’.

Há quem recorra à psicoterapia porque é o único lugar onde se sente vista, ouvida, reconhecida como um ser importante, especial, com valor. É o único lugar onde alguém está ali para elas, a dedicar 100% da sua atenção, uma hora da própria vida a ouvir as suas histórias, repletas de dor e, algumas vezes, também de alegria. Uma hora da própria vida de que não me arrependo de dar, mesmo se chegando ao leito da minha morte me perguntassem se gostaria de recuperar aquele tempo.

Voltaria a dar o meu tempo àquelas pessoas porque não lhes estou a dar apenas o meu tempo, mas algo que considero muito mais precioso: a minha presença. É uma forma de cuidar do outro e, simultaneamente, de mim. E quando sentimos que cuidamos de nós, também na relação com o outro, não há espaço para arrependimentos. A nossa presença no tempo do outro, no nosso tempo. A presença de estarmos conectados com o nosso interior, com o que sentimos perante os estímulos que nos chegam de fora… como é que a sua história se reflete na minha? Qual o impacto que a sua tristeza e a sua dor têm em mim? Que pensamentos ativam os meus? O que é que isto tudo diz sobre mim? E como posso cuidar disso para crescer e ser um ser humano melhor, mais feliz?

O que é estar com o outro? O que é dedicarmo-nos ao outro? Dizem que o tempo é o bem mais precioso que temos e, por consequência, o maior presente que podemos dar a alguém. O tempo não volta atrás. O tempo não se recupera. O tempo desaparece para sempre. Cada minuto que passa é menos um minuto de vida que temos. Se nos focarmos verdadeiramente na importância que o tempo tem, talvez consigamos usá-lo de forma mais consciente, da forma como queremos viver todos os minutos que nos restam. Para isso temos de estar presentes. Para isso temos de ser presentes. Para isso temos de olhar, viver, sentir o momento presente, o tão badalado ‘aqui e agora’.

Quando nos focamos nas necessidades do outro e lhes damos parte do nosso tempo de vida, vamos exigir-lhe algo em troca, mesmo que inconscientemente. É inevitável. É a expectativa que criamos das relações. Dar para receber. É o mecanismo que conhecemos: ajudar, cumprir com uma obrigação, sermos úteis, caso contrário somos egoístas ou sentimos uma culpa que nos corrói. Mas e o que é estar numa relação onde acima de tudo nos respeitamos a nós próprios, nos valorizamos e nos tratarmos bem? O que é estar com o outro simplesmente porque queremos, porque nos faz bem, porque nos enriquece a alma? O que é estar com o outro sem desculpas, sem favores, sem obrigações, mas simplesmente porque sim?

O que é estar com o outro porque nos queremos pôr em causa e abrir a novos pensamentos, novas sensações e assim alargar o nosso campo de consciência? O que é estar com o outro porque nos faz rir, nos faz refletir, nos faz companhia enquanto choramos? O que é estar com o outro em presença, onde nos olhamos, nos vemos, nos sentimos e assim ficamos? O que é estar com o outro nessa plena liberdade de escolha, fruto exclusivo do nosso desejo e vontade de estar? Aí estamos a dar-nos ao outro e, simultaneamente, a receber porque nos estamos a dar a nós, pelo que deixa de haver espaço para exigências ou carências.

Num registo bastante comum, passamos do querer as coisas depressa, a fazer as coisas à pressa, e ao esperar que o tempo passe… Consumimos o tempo sem a nossa presença, vamos sobrevoando pelas pessoas que se cruzam connosco na vida sem as sentirmos, sem nos sentirmos. O que é estar com alguém que atende um telefone e fica na conversa como se não estivéssemos ali? O que é estar num messenger e receber a mensagem errada porque o outro estava a escrever a mais pessoas?

O que é ouvir uma pergunta repetida porque a nossa resposta não foi ouvida? Qual a presença do outro enquanto diz estar connosco? Que sensação de presença temos quando chegamos a casa e ninguém lê o vazio no nosso olhar? Ou o contrário: o que é estar em relação com alguém em plena ausência? É simplesmente trairmo-nos a nós próprios. É estarmos desligados de nós, é andarmos distraídos da vida, é não usufruir do maravilhoso presente que é o tempo.

A nossa vida, o nosso tempo, sem a nossa presença não tem valor. Estar presente é estar em contacto com o que se passa dentro de nós à medida que vamos acolhendo o que se passa fora de nós. Estar presente é estar conectado consigo próprio e devolver ao outro as nossas sensações, respeitando as ressonâncias internas que se vão tendo neste diálogo entre o exterior e o interior. Estar presente é sentir a nossa presença e a do outro, é entregar-se a esse espaço criado por ambos.

Quantas vezes estamos com alguém e sentimos ter perdido tempo? Para não perder esse tempo é necessário sentir que se ganhou e só se ganha quando sentimos que aquele encontro nos enriquece, nos muda, nos faz pensar, nos faz sentir. Só se ganha quando nos partilhamos, sem desculpas, sem favores, sem justificações, mas simplesmente porque sim. Porque quero estar presente no teu tempo e no meu.
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Gostar de mim

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‘Já percebi a importância de me pôr em primeiro lugar, de me amar e cuidar de mim, de me proteger e me nutrir de forma a fortalecer a minha autoestima, mas ainda não percebi como se faz.’ Este é o tipo de frase que oiço com frequência quando falamos no desejo de nos sentirmos bem connosco próprios e, consequentemente, na relação com os outros.

Costumo perguntar: ‘O que farias se a pessoa que mais amas na vida se encontrasse na situação em que sentes que devias pôr-te em primeiro lugar e não sabes como?’ Dou como exemplo uma pessoa que facilmente se repreende a si própria quando algo não corre como ela acha que devia ter corrido: ‘correu mal porque não me esforcei o suficiente, porque estava nervosa, porque não fui assertiva, porque sou insegura e não controlei as minhas emoções…’. Da autoagressão oscila para uma agressão externa: ‘se ele não me tivesse falado daquela forma eu não teria ficado nervosa; se ele tivesse sido amável e atento, eu teria dado a volta’, etc. Quer num caso, quer noutro, com este tipo de leitura estamos a fazer o contrário de cuidarmos de nós. A crítica, o julgamento, a repreensão e a culpa estão no oposto da aceitação, do perdão e da compaixão.

Se o teu filho, o teu companheiro, o teu amigo, o teu irmão – imagina a pessoa que mais amas neste mundo – experienciasse o mesmo tipo de situação, o que lhe dirias? ‘Que não faz mal, que talvez da próxima corra melhor e que estarei sempre aqui para ele, aconteça o que acontecer’. Porque não dizemos isso a nós próprios? Porque somos tão críticos e exigentes connosco quando conseguimos ser tão amorosos com o outro?

Colocarmo-nos em primeiro lugar, olhar para o que sentimos e pensamos antes de olharmos para o outro, não é um ato de egoísmo. É um ato de amor. Para connosco e para com o outro. Colocarmo-nos em primeiro lugar no que se refere a cuidarmos de nós e nutrirmo-nos é, antes de mais, assumir a responsabilidade da própria vida e desresponsabilizar o outro de o fazer. Ninguém tem a obrigação de satisfazer as nossas necessidades, ninguém tem a obrigação de nos compreender e resolver os nossos problemas. Partir desse princípio é importante para relações saudáveis, adultas, de genuinidade e liberdade. Se o outro quiser cuidar de nós que o faça porque nos ama e isso lhe dá prazer, não porque pedimos e/ou exigimos. Em crianças era obrigação dos pais zelar pelo nosso bem-estar psicofísico, em adultos somos nós a ter a honra dessa tarefa.

Em termos práticos, o que é que isso significa? Tracy McMillan, numa TedEx que muito me inspira para esta temática, baseia-se nos votos de um casamento tradicional para expor o que é casar-se consigo próprio, o que é tornarmo-nos a pessoa mais importante da nossa vida:

Prometo amar-te e respeitar-te…

  • Na alegria e na tristeza: quando estamos alegres gostamos de nós e apreciamos o nosso humor; e quando estamos tristes? Será que nos mimamos, nos respeitamos ou, pelo contrário, procuramos uma fuga ao que sentimos?
  • Na saúde e na doença: quando estamos bem somos funcionais, mas quando estamos doentes quantas vezes nos irritamos, nos desrespeitamos (até vamos trabalhar com febre)? Quantas vezes chegamos a dormir pouco por falta de tempo, a comer mal por impaciência, a adiar uma ida à casa-de-banho para não interromper uma tarefa? Como cuidamos do nosso corpo, o templo que habitamos?
  • Na riqueza e na pobreza: nos sucessos e nos fracassos, será que festejamos ambos como passos num percurso de aprendizagem e crescimento? Será que nos sentimos gratos pelo que temos ou vivemos na insatisfação do que não temos?
  • Todos os dias da nossa vida até que a morte nos separe: será que nos amamos hoje e todos os dias, independentemente das circunstâncias, como gostaríamos de ser amados? Será que nos aceitamos hoje, tal como somos, no que são as nossas potencialidades e vulnerabilidades, com as nossas forças e os nossos medos?

Uma relação de compromisso connosco próprios não é uma questão de experimentar para ver se funciona: os princípios do respeito, da aceitação, da proteção, do cuidado e da nutrição emocional devem ser a nossa prioridade sempre, tal como gostaríamos que os outros fizessem connosco. Numa situação que nos provoca dor ou desconforto, responder a determinadas questões pode servir de orientação:

  • Estou consciente do que o outro me faz sentir?
  • Na resposta que dou à situação, estou a respeitar-me?
  • Estou a proteger-me?
  • Estou a identificar as minhas necessidades?
  • Estou a cuidar de mim e a nutrir-me?

Colocar-se em primeiro lugar, na sequência de sentirmos que a nossa vida tem valor e merece ser honrada, faz desvanecer sentimentos de culpa – o foco deixa de ser ‘magoar o outro’ e passa a ser ‘cuidar de nós’ (como faríamos com o ser que mais amamos) – e faz aumentar a nossa autoestima – ao cuidarmos de nós sentimos que temos valor, pelo que o ciclo se autorreforça.

Enquanto nos movimentarmos na vida em busca de sermos amados pelo outro, como se tivéssemos um vazio possível de ser colmatado apenas pelo amor de outra pessoa, vamos focar a nossa atenção em satisfazer as suas necessidades na esperança que nos ame e satisfaça as nossas. Se, pelo contrário, focarmos a nossa atenção em nós, numa atitude de curiosidade e exploração do que (não) gostamos, do que (não) faz sentido, do que (não) queremos, então tornamo-nos os protagonistas da nossa história.

Quando nos sentimos os verdadeiros protagonistas da nossa história, deixa de interessar se o outro gosta de nós, pois o que interessa é se nós gostamos do outro. Não interessa o que é nós lhe fazemos sentir, mas o que ele nos faz sentir a nós. A nossa escolha será tanto mais genuína e nutridora quanto livre de expectativas e medos: ‘quero uma relação contigo porque gosto do que sinto na tua presença’ é diferente de ‘preciso de estar contigo porque sem ti fico perdido e vazio’. No primeiro caso há liberdade, no segundo há dependência. E enquanto houver dependência não há espaço para uma relação de partilha.

Cuidarmos de nós porque gostamos mesmo de quem somos, numa primeira fase, é excluir o outro da equação, para depois o incluir na partilha. As relações são o que de mais importante temos na vida, mas a primeira relação a dar atenção e a acarinhar é aquela que temos connosco próprios, pois as outras vão apenas ser uma consequência desta. Quando gostamos de nos fazer companhia, quando nos apaixonamos pelo processo de autoamor, quando vemos o outro por aquilo que ele é – e não em função do que queremos que nos dê –, então estamos a tratar-nos bem.

No entanto, deixo um alerta! Ficarmos pela paixão por nós próprios pode-nos fazer cair na armadilha do narcisismo, em que vemos o mundo apenas em função de nós. Conseguir ir além é entrar na partilha de quem somos (não do que fazemos), pois é na vulnerabilidade do nosso ser que se cria o vínculo e a possibilidade de uma relação saudável.

www.rossana-appolloni.pt

Fotografia de Bernardo Conde www.bernardoconde.com

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Terapia de Grupo

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O que é a Terapia de Grupo?

A terapia de grupo respeita o mesmo método e objetivos da psicoterapia individual, mas organiza-se através de um contexto em grupo onde aumentam as oportunidades de a pessoa se conhecer mediante a relação com os outros. O contexto emotivo-afetivo pautado pela confiança e pelo respeito mútuo facilita a consolidação de um sentimento de segurança e de pertença, diminui a resistência à mudança e expande a capacidade de aprofundar as relações interpessoais.
A experiência de grupo pode reforçar o espírito social e relacional, promover o processo de comunicação e reduzir as tensões. Mas o resultado mais notável reside porventura na mudança que introduz ao nível do comportamento da pessoa fora do grupo, na medida em que a ajuda a conhecer, expressar e expandir a sua verdadeira natureza.

Horário

Terças-feiras das 19.30 às 21.30
Início: 5 de setembro

Valor: 60 € mensais

Para participar é necessária uma entrevista prévia com a terapeuta Rossana Appolloni (marcações por email rossana.appolloni@gmail.com)

Testemunhos

“Embarcar nesta experiência foi o melhor investimento que alguma vez fiz em mim mesma! Com muito medo e insegurança apostei em desafiar-me e sair da zona de conforto. Através da partilha em grupo e do grupo encontrei espaço para sentir e através dos vários sentires, encontrei respeito, conforto, acolhimento, compaixão, ternura e sobretudo ACEITAÇÃO. Neste grupo, onde me sinto parte integrante, encontrei espaço para ser EU mesma, sem condicionalismos ou reservas! Eternamente GRATA!”
R.F.

“Tem sido um percurso de auto conhecimento muito enriquecedor, onde me fui desafiando a olhar para mim com verdade, onde se torna inevitável distinguir o que é meu do que não é (na esfera do sentir e do pensar) e onde vou aprendendo a respeitar e honrar o que não queria ver, o que não queria aceitar em mim. Sempre com amparo, acolhimento e ternura de todo o grupo, sobretudo nas alturas de maior desconforto. É sentir aconchego na dor e alegria na conquista.”
V.C.

“Num momento da minha vida que precisava de parar, criar tempos para mim e olhar para dentro para me redescobrir; iniciei um percurso terapêutico individual. Com paciência, sensibilidade e muito carinho foi-me lançado o desafio de fazer esse percurso em grupo. Foi um grande desafio, mas encontrei neste grupo uma confiança, apoio e aceitação que me têm ajudado, tornando o percurso menos só, e enriquecido, tornando esta experiência mais sentida e vivida. Não só por ter espaço e tempo para partilhar de mim, mas também por ao sentir as outras partilhas, acabar por entrar em contacto com outras partes de mim – o que a sós não seria possível. Ao descobrir o Outro, tenho-me descoberto muito, tendo no grupo um espaço sereno onde a autenticidade pode fluir naturalmente. Obrigada por partilharem comigo este percurso.”
S.L.

Sobre a Rossana Appoloni
Após uma primeira formação académica em Cinema na ESTC de Lisboa, Rossana Appolloni foi para Itália, onde conheceu a Psicossíntese, um modelo psicoterapêutico de natureza humanista-existencialista. É licenciada em Linguística e mestre em Psicolinguística pela Faculdade de Letras e Filosofia da Universidade de Perúgia (Itália) e diplomada em Counselling pela Società Italiana di Psicosintesi Terapeutica de Florença, da qual é membro. É ainda mestre em Psicologia Clínica pela Universidade Lusófona de Lisboa e, além de dar formação, dedica-se à prática do counselling individual e de dinâmicas de grupo.

É autora dos livros “Ousar Ser feliz – Dá trabalho mas compensa!” e “Do Sofrimento à Felicidade“, publicados pela Self.
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Observar, sentir e ser em relação

relação

Uma vida com sentido só é possível quando somos capazes de escrever a nossa própria história, quando conseguimos dar primazia ao que pensamos e sentimos em vez de a dar ao outro, quando tomamos decisões coerentes com a nossa essência, quando reconhecemos e respeitamos a nossa natureza, quando valorizamos o nosso potencial e o tentamos manifestar no mundo, quando honramos as nossas necessidades e desejos, quando mergulhamos em relações que nos nutrem e reforçam todas as capacidades individuais. Manter a própria autonomia numa relação traduz-se em preservar a própria identidade, ao contrário de a perder no outro. E isso só é possível através de um autoconhecimento profundo.

Conhecer-se é ser capaz de identificar o que é nosso e o que é do outro, é ter a consciência do que pensamos e sentimos durante a interação com alguém. Se tivermos uma consciência muito presente do que somos, de onde estamos e do que queremos para a nossa vida, em lugar de nos afogarmos ao mergulhar no oceano das relações, sentimos o prazeroso contacto com a água e a transformação que se dá em nós através dessa experiência.

Os outros fazem parte da nossa existência. Seria terrível se o nosso falso desejo de estar numa ilha deserta, em paz, se concretizasse. Somos seres sociais por natureza, desde sempre. É com os amigos que potenciamos as nossas alegrias e atenuamos as nossas tristezas, é com eles que sentimos conforto, compreensão, cumplicidade, ligação, vínculo. É através dos outros que nos conhecemos, pois é com um gesto amável que nos comovemos e com um gesto de rejeição que nos sentimos magoados. Independentemente da sua intenção, o importante é o que nós sentimos e ganhar essa consciência é reconhecer os nossos medos e os nossos sonhos, é perceber do que gostamos, do que precisamos e do que não queremos. É também através dos outros que crescemos, pois com eles vamos sanando feridas e concretizando desejos, não é seguramente ficando fechado em casa na esperança que tudo à nossa volta mude.

A vida encontra sentido quando criamos vínculo nas relações. Vinculamos quando satisfazemos a necessidade básica universal do ser humano de pertença. Sentir que se faz parte é uma das sensações mais reconfortantes que podemos ter e é tão poderosa que não é por acaso que estrangeiros que vivem fora do seu país tendem a procurar pessoas da mesma nacionalidade: partilham valores e formas de estar na vida onde se reconhecem e sentem pertencer a algo que ultrapassa a personalidade individual. Procuramos suprir esta necessidade de pertença em vários tipos de grupo (desporto, passatempos, família, etc.), mas muitas vezes sentimo-nos insatisfeitos porque em vez pertencermos sentimo-nos apenas integrados, o que não é a mesma coisa.

‘Integrar’ significa adaptar-se para ser aceite, implica o esforço de entender o funcionamento dessa(s) pessoa(s) e moldar-se ao seu mecanismo. Pelo contrário, ‘pertencer’ implica mostrar-se, expor a nossa natureza, em ambas as vertentes: medos e desejos, inseguranças e necessidades. Implica ser autêntico, o que é paradoxalmente difícil, pois passa por reconhecer o que sentimos para depois exprimi-lo, correndo sempre o risco de não sermos compreendidos e aceites. Quando isso acontece a dor é imensa, mas quando o interlocutor está recetivo e nos aceita, a relação fortalece-se. Permitir que o outro aceda às nossas imperfeições é a única maneira de alimentar uma relação verdadeira e nutritiva.

É pelas imperfeições reveladas através da nossa vulnerabilidade que se cria um vínculo saudável. O vínculo é o que existe entre as pessoas quando se sentem vistas, ouvidas, reconhecidas, valorizadas e amadas. Expor uma ferida aberta pode ser traumático, mas quando sentimos que do outro lado há abertura e empatia, pode ser curativo. Sentir essa confiança é fundamental, pois as relações também precisam de tempo e de um terreno fértil para crescer.

No medo de perder o outro colocamos uma máscara, fazemo-nos fortes, a custo de trairmos a nossa autenticidade. No entanto, se mostrarmo-nos é arriscado por desconhecermos a resposta do outro, ainda mais arriscado é escondermo-nos, pois isso leva-nos à ansiedade, à depressão e à dependência. Se dermos valor e honrarmos a nossa existência, partimos para a exploração dos nossos recursos internos, abrimo-nos à experiência, vamos atrás do prazer em vez de simplesmente evitar a dor, comunicamos de forma aberta e honesta e vivemos relações que nos fazem crescer. Nestas, não há espaço para uma fusão onde os dois se perdem na ilusão de serem apenas um, mas sim um encontro onde cada um mantem a sua identidade e surge uma terceira constituída pelos dois: Nós.

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Do outro lado do medo

medo

Medo da rejeição. Medo do abandono. Medo da humilhação. Medo da traição. Medo da injustiça. Estes são cinco dos medos básicos inerentes à condição humana, que se desenvolvem com maior ou menor intensidade segundo uma série de variáveis no nosso percurso de crescimento emocional.

Associado a cada medo existem necessidades psicológicas que, por não terem sido preenchidas em idade infantil, criam carências que transportamos ao longo da vida. Uma criança que tenha sentido traição ou abandono por parte de uma figura de referência permanece com esse sentimento registado no seu aparelho psíquico, o qual lança um sinal de alerta numa relação posterior onde sinta proximidade afetiva. O medo subjacente, despoletado nos primeiros anos de vida, condicionará as dinâmicas interpessoais em adulto, através de estratégias e mecanismos de defesa que adotamos de modo a evitar reviver o mesmo tipo de situação.

Assim, chegamos ao ponto de dizer ‘diz-me o que queres que eu faça, basta que não me deixes!’. Disponibilizamo-nos a fazer o que estiver ao nosso alcance para não passar pelo que outrora nos causou tanto sofrimento. O paradoxo surge quando, ao tentar evitá-las, acabamos por as provocar, repetindo-se assim o trauma mediante um padrão do qual queremos sair e não sabemos como.

Procuramos preencher as nossas carências através dos outros, esquecendo-nos que esses outros não existem para nos preencher. Cada pessoa tem as suas mazelas de crescimento, tem os seus medos e necessidades, e enquanto virmos no outro a fonte da nossa salvação vivenciamos um choque de exigências e cobranças, tornando a relação uma luta em vez de um aconchego.

Como passar de um campo de batalha, onde somos cada vez mais atacados e feridos, para um terreno seguro e nutridor, no qual vamos sanando o nosso coração?

Inicialmente procuramos o que nos é familiar. Não questionamos os hábitos que adquirimos até nos permitirmos ter uma experiência diferente que nos faça sentido. Se em criança somos sujeitos a críticas, assimilamos uma imagem negativa de nós próprios que nos acompanha como se fosse verdadeira. Podemos nem ter consciência dela, mas uma baixa autoestima condiciona as escolhas de vida e a qualidade das nossas relações. Se os nossos pais são demasiado protetores e nos incutem que o mundo é perigoso, a forma como nos movimentamos dificilmente será de confiança, pois tudo é visto como um risco. São inúmeros os exemplos que resultam em crenças falsas e prejudiciais, que condicionam o nosso sentir, logo, a nossa interação com o exterior.

Uma cliente minha sofre horrores no trabalho. Sente-se posta de lado pela dificuldade em aderir ao ambiente de euforia e diversão. Fica triste, o que, por sua vez, não é bem acolhido pelos colegas, intensificando assim a sensação de exclusão. A sua angústia começou a traduzir-se em sintomas físicos de fortes dores de barriga, dores de cabeça e tonturas, a ponto de recorrer a baixa médica. Longe do trabalho os sintomas aliviam, mas perante a ideia de alta reaparecem. Percebemos pela sua história que existe uma grande lacuna na necessidade psicológica de pertença. Quer fazer parte, mas as atitudes do grupo – e as dela própria – aumentam a sua dor de exclusão, potenciando, paralelamente, a sua necessidade de pertença. Vive numa carência profunda sem encontrar modo de sair desta pescadinha de rabo na boca.

Porque é que não muda de comportamento e se torna mais sociável? Ou porque é que não procura pessoas mais em sintonia com ela? Porque não é isso que o seu sistema emocional conhece! O que o seu sistema sabe fazer é tentar desesperadamente sentir-se pertence junto de pessoas que não a acolhem, que a criticam e que lhe provocam uma sensação de desadequação, pois foi isso que viveu em criança.

Estamos perante o que chamamos de repetição do padrão. Ao longo da vida repetimos um padrão de comportamento porque não conhecemos outro, por muito tóxico que ele seja. Quem viveu a falta de atenção e carinho em criança, vai cruzar-se com pessoas de quem não recebe suficiente afeto porque essa é a energia que lhe é familiar. Pessoas que dão carinho e atenção não se ajustam ao seu sistema de funcionamento na medida em que é um tipo de vibração que desconhece, que estranha, por muito que precise dela. Quem viveu a crítica sente-se inconscientemente atraído por pessoas que criticam, pois as outras não entram no seu radar. Quem sofreu a traição ou a humilhação, facilmente entra em relações onde é maltratado e traído, caso contrário não vincula. Curiosamente somos excelentes em dar aos outros o que nos faltou e precisamos de receber…

Qual a lógica de procurar algo que na prática rejeitamos, insistindo em receber o oposto do que queremos?! Repetimos um padrão simplesmente porque é o que conhecemos, mas como estamos num caminho onde, felizmente, o crescimento é possível, um passo nesse sentido é quebrar com o que nos é nocivo. No entanto, crescer implica fazer escolhas que se coadunam com as nossas necessidades de forma natural e não forçada, o que significa que algo interno tem de mudar. Imposições lógicas e racionais externas não funcionam.

Para crescer não basta perceber cognitivamente o mecanismo, há que sentir emocionalmente que chegou o momento de romper com um determinado padrão – que é fruto da nossa dinâmica interna e não da pessoa que o desperta em nós. A toxicidade está na nossa reação, não no outro. Precisamos de colocar a nossa integridade em primeiro lugar, valorizar o amor próprio e o autorrespeito em detrimento de uma carência infantil que berra pela atenção do outro e que entra em litígio quando não obtém o que quer. Chegou a hora de olhar mais para nós próprios e menos para o outro em função de nós. O outro nunca vai suprir as carências nem curar as nossas feridas. Em criança isso era possível, em adultos já não.

A possibilidade de alcançar esta clareza emocional chega quando se atinge um ponto de exaustão. Só no limite conseguimos declarar com convicção ‘já não aguento mais, algo tem de mudar. Não sei como fazer, só sei que assim já não dá para viver’. Só quando a dor se torna insuportável começamos a considerar a hipótese de desistir da rigidez do passado e dar um passo novo. Daí a importância de nos abrirmos ao sentir, de ouvir a nossa parte emocional. Quanto mais nos disponibilizamos a contactar os nossos sentimentos, mais sentimos a dor, mas só no contacto com a dor conseguimos quebrar os padrões de condicionamento.

A mudança implica o maior ato de coragem que podemos alguma vez ter: entregarmo-nos à possibilidade de reviver o nosso grande medo, a nossa cena temida de criança, com a consciência de que agora, em adultos, temos uma estrutura interna suficientemente forte e autónoma, capaz de dar uma resposta diferente ao exterior com vista a sair da prisão causada pelo trauma sofrido. Atraímos as pessoas e as situações que nos ativam as feridas internas não apenas porque nos são familiares, mas também porque só na relação com elas temos a oportunidade para alterar o nosso comportamento.

A mudança não é estanque, não passa por um corte repentino com o velho para amanhã acordar novo. Trata-se de um processo faseado em três etapas:

  • Adquirir consciência dos nossos mecanismos internos: medos, necessidades, feridas, defesas, carências que deixaram marcas profundas; conhecer a nossa história e fazer as pazes com ela, observando-a com amor e carinho.
  • Aceitar, ver as realidades interna e externa por aquilo que elas são, dissolver a ilusão de um passado e/ou de um futuro no qual fantasiamos acudir as necessidades junto de quem nos ativa as carências e que o outro vai mudar para nos salvar. Agora somos nós os nossos cuidadores; os outros podem (ou não) fazer-nos companhia neste processo.
  • Experimentar o que desconhecemos, abrirmo-nos ao imprevisível com a certeza de que o antigo já não serve o nosso propósito.

Dizer ‘não’ a situações e pessoas que nos atraem mas que nos fazem mal, largar e abrir mão do que temos vivido até aqui, distanciarmo-nos do que nos causa uma reincidência da dor, desta vez não por fuga ao sofrimento mas com a consciência de que isso alimenta uma dinâmica tóxica, é o que cria a verdadeira mudança num processo de evolução psicológica. Chegamos aqui se ao longo do caminho formos alimentando uma energia de amor e compaixão por nós próprios, pois a capacidade de abrir mão do tóxico apenas surge quando sentirmos uma necessidade urgente de agarrar o que é nutridor.

É imprescindível olhar e cuidar do nosso ser para que as escolhas sejam guiadas não pelas carências, medos e desejos do nosso ego, mas pelas necessidades reparadoras da nossa essência. Enquanto vivermos no medo de perder, não vivenciamos o que se esconde do outro lado: a liberdade de sermos nós próprios num caminho de desapego do passado e de amor incondicional pelo presente.

Foto de Bernardo Conde (www.bernardoconde.com)

 

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Esperança precisa-se

esperança

Um dos mitos clássicos da Grécia antiga conta-nos a história de Pandora, a primeira mulher criada pelos deuses por ordem de Zeus. Cada um dos deuses concedeu a Pandora uma qualidade particular que a fazia possuir características singulares e contraditórias: beleza e perfídia, inteligência e mentira, sedução e astúcia. Zeus atribuiu-lhe a missão de castigar os homens, como vingança por Prometeu lhe ter roubado o fogo divino e o ter entregue aos humanos.

Zeus envia Pandora a Epimeteu, irmão de Prometeu. Apesar deste o prevenir de que não devia aceitar qualquer presente dos deuses, Epimeteu fica fascinado com a beleza de Pandora e toma-a como esposa. Pandora recebe de Zeus como presente de núpcias um vaso, ou uma caixa, que suscita a sua curiosidade e que contem todos os dons conhecidos, os bons e os maus. Um dia Pandora retira a tampa da caixa e os males espalham-se pelo mundo, enquanto os bens escapam e regressam ao domínio dos deuses. Exceto um, que fica no fundo e não chega a sair porque Pandora volta a fechar a caixa. O que resta no fundo da caixa de Pandora é a esperança.

Os humanos ficaram deste modo a padecer de todo o tipo de males, como a morte, a doença, a dor, o ódio, a violência, a guerra, enquanto a esperança continua fechada na caixa de Pandora como derradeira consolação de quem espera dias melhores.

O mito de Pandora presta-se a várias interpretações em torno de uma questão ainda hoje pertinente: é a esperança um dom positivo ou negativo? É a esperança uma mera ilusão que nos engana, nos leva a distorcer a compreensão do que acontece e a perder o contacto com a realidade? Ou é a esperança o alento de que precisamos para ganhar confiança em nós próprios e vencer os desafios e os obstáculos que fazem parte da vida?

Além das mitologias pagãs também várias religiões usaram a noção de esperança como esteio da suas doutrinas. No Cristianismo a esperança é, juntamente com a fé e a caridade, uma das três virtudes teologais. Segundo a doutrina, as virtudes teologais não são adquiridas através da vontade ou do esforço humanos, uma vez que seriam concedidas diretamente por Deus aos crentes como sinal da salvação da alma. A esperança de inspiração divina estaria nos antípodas do desespero humano que aflige muitos fieis nos momentos de maior dúvida e sofrimento.

Esta antinomia entre esperança e desespero, entendida como conflito de emoções susceptível de influenciar o pensamento e o comportamento humanos, interessa particularmente à psicologia, na medida em que contribui para esclarecer o estado de ânimo da pessoa e a possível evolução da sua relação com o mundo, com os outros e consigo mesma.

A psicologia positiva retomou a tradição secular da sabedoria antiga acerca da ética das virtudes que proporcionam ao ser humano a hipótese de felicidade e nas quais se inclui a esperança. Há uma razão pragmática para não descurarmos a prática das virtudes que encaminham a vida para o bem-estar: ao adotá-las sentimo-nos melhor com nós próprios e com os outros, somos mais apreciados pelo meio social e é provável que, deste modo, sejamos mais eficazes a conseguir os nossos objetivos.

Embora a invocação da esperança possa ser um terreno fértil para os vendedores de ilusões, a esperança é uma atitude indispensável mesmo para aqueles que contam apenas com as suas forças. Enquanto virtude estritamente humana, a esperança requer a firmeza das convicções e a determinação para trabalhar no sentido de as realizar. Ter esperança não é ficar inerte à espera que as nossas aspirações aconteçam por um passe de magia, é tão somente a disposição de perspetivar o melhor futuro possível para os vários aspetos da vida e dar-lhe um sentido. A esperança é um antidoto contra a incerteza e o derrotismo, alimenta o desejo que as coisas corram bem, dá o alento necessário para prosseguir um caminho traçado e estimula a resiliência.

A esperança é uma virtude direcionada para o futuro e, como tal, carregada de potencial positivo. Está, portanto, associada ao pensamento otimista e à motivação para alcançar objetivos concebidos por iniciativa própria. Se as pessoas otimistas têm mais sucesso do que as pessimistas é precisamente porque acreditam em si, são persistentes, não desistem, em suma, têm esperança.

É certo que o otimismo em excesso pode afastar-nos do princípio de realidade e fazer-nos perder a consciência da nossa dimensão no mundo. Assim, não é prudente deixar de avaliar os riscos e as dificuldades inerentes a cada situação que enfrentamos e de ponderar racionalmente as hipóteses que estão ao nosso dispor.

A esperança tem um fundamento mais sólido do que o otimismo. Enquanto este tende a acreditar simplesmente no curso favorável dos acontecimentos, a esperança é indissociável da atitude concreta que anima o sujeito a identificar os objetivos que pretende e a encetar as ações adequadas para os conseguir. Nenhum projeto se concretiza se não acreditarmos nele e na nossa capacidade para o levar a cabo.

Nesta perspetiva a esperança é indissociável da força de vontade e da crença em si próprio para executar com êxito determinadas tarefas ou metas. As pessoas que acreditam na sua eficácia têm tendência para definir projetos mais ambiciosos e inovadores, para levar a cabo as decisões que tomam e os compromissos que assumem.

As pessoas que acreditam na sua eficácia sentem-se mais motivadas para enfrentar novos desafios e para planificar as suas ações para o futuro. Um individuo competente que duvida de si próprio procede aquém das suas capacidades e engendra surtos de ansiedade que o impedem de ir mais longe. As pessoas que não acreditam em si, ou não acreditam naquilo que estão a fazer, não têm motivação para vencer as dificuldades que enfrentam. Quem não confia em si mesmo tem maior probabilidade de fracassar, de desistir, de perder a esperança.

A esperança tem uma dimensão afetiva variável que não convém ignorar, uma vez que, em parte, é sustentada pelo respetivo temperamento individual. É também mais frequente e natural acalentar esperança na companhia de pessoas que amamos do que estando sozinho. Companheiros, familiares e amigos fazem parte dessa teia maravilhosa em que estão envolvidos os nossos sentimentos mais profundos.  Na medida em que envolve a perceção e o entendimento de resultados desejados, a esperança é um constructo mental de carácter cognitivo que consolida as crenças e os pensamentos positivos.

Olhando para os noticiários do que se passa no mundo temos por vezes a sensação de que alguém se apoderou da caixa de Pandora e continua a espalhar o mal por toda a parte. Não podemos desistir de elevar a nossa existência, de defender a dignidade humana e de contribuir, pelos meios ao nosso alcance, para o bem comum. Nas situações difíceis, a esperança é a última a morrer e a primeira a ser chamada.